domingo, novembro 10, 2013

ALBERT CAMUS: ÁVIDO DE LIBERDADE E DE JUSTIÇA



No dia 7 de novembro de 2013, teria feito 100 anos, se ainda fosse vivo.

Albert Camus nasceu a 7 de novembro de 1913, no turbilhão da Primeira Guerra Mundial, debaixo do céu azulado e do sol luminoso da Argélia, então colónia francesa.
O mundo recebeu-o num bairro pobre de Argel. Após uma infância simples e feliz, num bairro popular de Argel, em que gostava de jogar à bola e de nadar nas águas quentes do Mediterrâneo, cedo começou a destacar-se, na escola, pela extraordinária capacidade de escrita.



Um professor de filosofia anteviu acertadamente naquele rapaz ávida de vida e de sol, uma personalidade e um talento excecionais. Tornaram-se amigos. 
Graça a uma bolsa de estudos, formar-se-á em filosofia. Admirava a obra de Dostoievski e de Nietzsche.



Viveu. Escreveu. Por incrível que pareça foi no meio do sol e do céu azul, na proximidade do mar revigorante que Albert Camus teve a intuição do carácter absurdo do mundo e da existência. O romance L'Étranger (1942), onde o protagonista, o enigmático Meursault, vivencia a descoberta do absurdo da existência é só, ainda hoje, o romance mais lido no mundo, estando traduzido em 55 línguas. A vida é simultaneamente luminosa e sombria. Exaltante e atroz. Sol e sombra. Vida e morte. Essa obra já  foi até publicada em banda desenhada.






Albert Camus amava a sua terra natal. Descreveu esses laços de ternura e de paixão em vários livros.
Viajou pelo interior colonizado da Argélia e não gostou do que viu. Disse-o. 
Foi sempre de uma integridade luminosa, sem condescendências, nem subterfúgios. Foi voz erguida, por vezes isolada, contra todas as formas de injustiça, de sujeição e de alienação do ser humano.
Viu, antes muito antes de muitos que se diziam mais inteligentes e perspicazes, o terror debaixo da capa fina da igualdade.


Veio viver para França, na véspera de uma outra Guerra mundial, desta vez a Segunda. 
Conheceu toda a gente que era gente intelectualmente famosa, um enxame que rodeava como vespas à volta do filósofo e escritor Jean-Paul Sartre.
Camus detestou Paris. Uma Paris cinzenta e fria, de onde o sol da sua Argélia natal estava ausente.



Camus detestou a matilha de escritores que seguia Sartre. Após uma certa empatia inicial, depressa Camus se sentiu como a ovelha perseguida pela matilha.
Desavenças. Críticas. Incompreensões. Traições. Acusações mútuas. Invejazinhas literárias. O caldo depressa ficou entornado.



Durante a Segunda Guerra Mundial, Albert Camus, ao contrário de outros, nunca abdicou da sua liberdade e das suas convicções. 
Arriscou a sua vida envolvendo-se pessoalmente no movimento da Resistência Francesa, lutando contra a ocupação nazi da França.
Muitos vêem, aliás, que a epidemia de peste descrita no romance La Peste (1947) é precisamente uma alegoria do nazismo ou de forma global de todos os regimes repressivos e totalitários.
Após a guerra, foi um dos primeiros a refletir e a rejeitar o terrorismo. Nada justifica a morte de um ser humano, a vida é demasiado preciosa.
Foi um dos primeiros a vislumbrar a falsa liberdade e igualdade dos países comunistas do Leste. Denunciou amargamente o que viu. 
Disse, uma vez mais o que pensava no ensaio L'Homme Révolté (1952). Para Albert Camus, nenhuma forma de violência é legítima.


Sartre e a sua raivosa matilha nunca lhe perdoaram tamanha ousadia. Camus tinha destruído os sonhos de uma geração. Nesses tempos, a ideologia comunista era uma utopia desejada por muitos intelectuais de esquerda, em França. Camus foi, por isso, perseguido, ridicularizado, rebaixado. Perdeu amigos, relações, mas não perdeu a sua autenticidade, nem a sua verdade. 




Albert Camus nunca abdicou da sua integridade e das suas ideias clarividentes.
Mas os golpes tinham sido fortes. Exagerados.
Albert Camus abandonou os lobos parisienses e foi viver para o Sul de França, onde reencontrou o sol quente da sua terra natal. 
E ajustou contas num romance intenso, forte, lapidar La Chute (1956).
O Prémio Nobel de Literatura saudou-o, com toda a justiça, em 1957.



O reconhecimento era total. Camus voltou a ganhar confiança. Reencontrou na quente, calma, e soalheira terra onde vivia no Sul de França, em Lourmarin, a alegria de viver e de escrever.
A situação na Argélia dilacerou este filho do sol. Crimes, bombas, sangue vertido, atrocidades mútuas, quer d parte dos franceses, quer dos árabes, a luta pela independência era violenta. Camus nunca conseguiu optar por um ou outro campo.



Os seus afazeres ditaram que, no dia 7 de novembro de 1960, tivesse de deslocar-se a Paris. O seu editor e amigo, Michel Gallimard, ofereceu-lhe boleia até à capital. Camus aceitou.
Quando, nesse dia, um automóvel de alta cilindrada embateu violentamente contra uma árvore na beira de uma estrada, o absurdo da existência assinou mais uma trágica página. 

Camus faleceu tragicamente. Tinha apenas 46 anos. A seu lado, dentro de um sacola de pele, encontrava-se o manuscrito de uma obra inacabada, que a sua mulher Francine retranscreveria e a sua filha Catherine publicaria anos mais tarde: Le Premier Homme (1994), um livro de grande e rara beleza no qual Albert Camus evoca a sua infância feliz na sua Argel natal. 


Evocar Albert Camus, por ocasião da celebração do centenário do seu nascimento é mais do que uma obrigação. É sobretudo um acto de justiça para com uma personalidade extraordi-nária que nos deixou uma obra diversa, admirável e profunda, de uma riqueza humana incontornável e única. Tremendamente atual. Como todas as obras intemporais, que desvendam a verdade da natureza humana.

Prof.  Hugo Vaz


Albert Camus, o seu pensamento, o seu estilo de grande pureza continuam vivos e acessíveis através de uma obra vasta e multifacetada. Eis alguns títulos essenciais:



- Révolte dans les Asturies (1936) - ensaio

- L'Envers et l'Endroit (1937) - ensaio

- Noces (1939) - ensaios sobre a Argélia

- Le Mythe de Sisyphe (1942) -  ensaio sobre o sentimento absurdo

- L'Étranger (1942) - romance

- Caligula (1941) - teatro

- Le Malentendu (1944) - teatro

- Réflexions sur la Guillotine (1947) - ensaio

- La Peste (1947) - romance

- L'État de siège (1948) - teatro

- Lettres à un ami allemand (1948)

- Les Justes (1949) - teatro

- L'Homme révolté (1951) - ensaio

- L'Été (1954) - ensaio

- La Chute (1956) - romance

- L'Exil et le Royaume (1957) - novelas

- Réflexions sur la peine capitale (1957) - ensaio em colaboração com  Arthur Koestler

- Le Premier Homme (1994) - romance inacabado, publicado postumamente pela sua filha.



Para (re)descobrir Albert Camus:




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